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quinta-feira, 6 de maio de 2010

Resumo - Associativismo, Juventude e Participação

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Fórum "Ideias com Futuro"

Candidatura de Paulo Valério à CPC do PS Coimbra

27 de Abril de 2010

Café Santa Cruz

Participantes:


Elísio Estanque (moderador)
Pedro Rodrigues
Daniel Francisco

Elísio Estanque começou por realçar a actualidade e a importância, social e política, da discussão em torno das questões da juventude, associativismo e participação, áreas sobre as quais tem desenvolvido parte da sua actividade académica, cívica e política. Valorizou a importância da reflexão e discussão pública, para a consolidação da vida democrática do País, quer ao nível do funcionamento eficaz e transparente das instituições públicas, quer em termos de envolvimento da sociedade civil e das associações, no debate público em torno dos problemas colectivos. De acordo com o sociólogo, o sentimento de desencanto e de frustração e a indiferença que perpassam uma larga franja da sociedade, relativamente às instituições em geral, e aos partidos políticos, em particular, devem ser discutidos com os próprios partidos. Lamentando a desvirtuação e a corrosão de alguns dos valores inscritos no referencial ideológico dos partidos políticos, nomeadamente nos da esquerda democrática, defendeu a necessidade de os militantes serem, antes de mais, activistas políticos, que se inquietem perante os problemas colectivos. Por entender que, sem partidos políticos, não poderá existir uma boa democracia, é sua convicção de que aqueles que possuem vocação de poder, como o Partido Socialista, só se poderão renovar se abrirem espaço ao debate, envolvendo cidadãos independentes, com consciência da relevância da causa pública, no sentido de recuperar a dignidade que a actividade política e partidária teve, no passado, em Portugal. Neste sentido, Estanque advoga que os partidos políticos têm de se afirmar como exemplares defensores dos seus programas, dos valores e da ética política, promovendo o debate aberto de ideias.

Considerou, no entanto, necessário um esforço de actualização teórica e doutrinária, que permita a renovação e a reactivação da discussão em torno das diferentes matrizes ideológicas dos partidos, no sentido da sua maior adaptação aos problemas da actualidade.

Constatou que o associativismo não se esgota nos partidos políticos, podendo assumir muitas outras formas (associativismo juvenil, ambiental, cultural, …), através das quais, os cidadãos poderão dar o seu contributo para a comunidade onde se inserem. A este respeito, concluiu que uma sociedade desenvolvida e uma democracia avançada, só serão possíveis, se os cidadãos assumirem a sua quota-parte de responsabilidade no aprofundamento dos pressupostos democráticos e na sua permanente renovação.
Defendeu também a ideia de que a participação dos jovens, na vida política, não indicia necessariamente mais debate, transparência ou valores, aludindo ao défice de formação cívica que se observa nas gerações mais novas, mas também aos problemas estruturais da própria sociedade, decorrentes de questões como a conjuntura económica ou as dificuldades na procura de emprego, como factores que eventualmente poderão justificar o cepticismo e o desinteresse pela causa pública, por parte desse grupo etário.

Desvalorizando a participação exclusivamente pela via do protesto, da crispação ou do dramatismo, Elísio Estanque defendeu meios que permitam combinar a necessidade formativa e o sentido lúdico da partilha, como forma de assegurar um maior envolvimento das pessoas nas questões públicas.

Por outro lado, defendeu a concertação de diferentes formas de exercício democrático, para além da democracia representativa, que reinventem o exercício de participação, obrigando os responsáveis políticos a reservar ao cidadão, o poder de decisão face a determinadas questões, que o co-responsabilizem, ao mesmo tempo que se confere maior transparência e abertura a esse mesmo processo de decisão. Contudo, prosseguiu, tal só será possível, com lideranças fortes, que mobilizem e criem estímulos à participação dos cidadãos.

Considerou ainda premente o conhecimento dos meios de comunicação pela internet, como forma de compreender o baixo índice de participação dos jovens e de estimular a sua actividade política e cívica e o debate público.

Concretamente em relação ao associativismo cultural, Elísio Estanque sublinhou a importância da cultura, não apenas enquanto bem em si mesma, mas também pelo seu carácter mobilizador dos cidadãos em torno da causa pública, em sentido lato. Aludindo ao contributo enriquecedor, do ponto de vista social, humano, das colectividades e da própria comunidade local, que a cultura proporciona aos cidadãos, alertou para a possibilidade de esta poder também tornar-se um veículo de alienação e de superficialidade colectiva, com o mero fim de daí se retirarem dividendos políticos.

Intervindo na qualidade de membro de duas associações, uma companhia de teatro profissional (Escola da Noite) e uma associação dedicada ao intercâmbio teatral entre os países de Língua Portuguesa (Cena Lusófona), Pedro Rodrigues começou por evidenciar a enorme diversidade de associações e de critérios que conduzem à sua formação (geográficos, etários, profissionais, …).

Concretamente no que concerne às associações culturais, vocacionadas para a promoção dos interesses culturais da população ou dos seus associados, explicou que a diversidade era igualmente notória, englobando filarmónicas, companhias de teatro amador, ranchos folclóricos, orquestras, grupos que se constituem como associações, para a organização de tertúlias ou de concertos, por exemplo, mas também o associativismo informal, como o caso do Mercado do Quebra-Costas, entre muitos outros. Desta análise, sobressai a diversidade de objectivos, âmbitos, dimensões e de papéis a desempenhar, por parte das associações culturais.

Prosseguindo, o dirigente associativo referiu que essa diversidade deriva do dinamismo próprio da sociedade, dos interesses e das necessidades que as pessoas pretendem satisfazer, através da criação dessas associações, não lhes cabendo necessariamente a reflexão em torno das consequências ou das causas dessa mesma diversidade, nem tão pouco do significado político decorrente da sua existência. Do ponto de vista da sua perspectiva, o poder político, designadamente as autarquias, têm a responsabilidade de olhar para essa diversidade, compreendendo-a e actuando de forma a aproveitar a riqueza que advém das diferentes formas de associativismo cultural, que não têm de ser antagónicas ou concorrentes entre si, mas complementares, contribuindo para a formulação de melhores políticas na governação de uma cidade.

Referindo-se à sua experiência pessoal, Pedro Rodrigues assinalou que o associativismo cultural tem sido visto, em diferentes momentos, pelo poder político, com diferentes olhares: ora com receio das críticas e das exigências que normalmente estas associações reivindicam e que pode indiciar alguma contestação menos controlada; ora com complacência ou até mesmo paternalismo, nos momentos em que o poder político decide distribuir apoios financeiros às diferentes associações culturais; ora de forma instrumental, quando os agentes políticos escolhem um ou mais parceiros privilegiados e a eles restringem a sua ligação ao meio associativo, o que se revela pouco eficaz sob o ponto de vista daquilo que deve ser uma governação política adequada.

Pedro Rodrigues sublinhou também a tendência para se uniformizar o tratamento das associações, ignorando os diferentes contributos que cada uma pode proporcionar, o que traduz uma estratégia de maior comodidade do ponto de vista operativo e da comunicação entre autarquia e associações, uma vez que é mais fácil proceder-se à constituição de um ficheiro e ao envio cíclico de informações ou de pedidos de informação sobre a actividade das associações, do que deslocar-se ao terreno, com o intuito de conhecer directamente essa mesma actividade. Também do ponto de vista político, essa estratégia se torna mais cómoda, porque dispensa o poder político de dar justificações sobre as opções que toma, no sentido de estabelecer parcerias com uma determinada associação, para o desenvolvimento de uma actividade em concreto.

A este propósito, Pedro Rodrigues manifestou a sua reserva relativamente à existência de um regulamento que estabeleça os apoios a atribuir às associações culturais, por se tratar de um instrumento uniformizante, que tende a tratar por igual, aquilo que é manifestamente diferente, ao invés de valorizar as potencialidades dos diversos tipos de associações.

No seu entender, trata-se de confundir transparência e equidade, com burocracia e um certo democratismo, evitando justificar-se o tratamento diferencial entre as diversas instituições. Deste modo, considerou necessária a existência de um trabalho de maior proximidade entre autarquia e associações, de forma a conhecer a actividade e as necessidades destas, fazendo depender da amplitude do interesse público do trabalho desenvolvido junto da comunidade, o apoio a conceder, o qual não se restringe necessariamente ao subsídio financeiro. Discordando da atribuição apriorística dos apoios públicos, que se verifica generalizadamente no contexto nacional, salientou que o trabalho concertado entre autarquias e associações, permitiria também o seu contributo para a definição e concretização das políticas públicas, nesta área, por se tratarem de parceiros privilegiados, portadores de informações sobre o que se passa no terreno e sobre as necessidades das populações, sem descurar os meios técnicos e humanos que as associações têm ao seu dispor, que poderiam ser potenciados pelas políticas públicas definidas pelas autarquias.

Ainda a respeito do apoio financeiro às associações, considerou que o aspecto mais relevante em matéria de financiamento público, passa pela análise, por parte dos responsáveis políticos, dos fundamentos que subjazem a esse mesmo financiamento, de forma a evitarem-se mecanismos automáticos de concessão de apoios a determinadas actividades e estruturas, independentemente do interesse público que elas possam representar. Para que isso aconteça, é necessário um conhecimento de proximidade, daquilo a que as associações se propõem desenvolver e das suas necessidades concretas na prossecução de um determinado projecto, em conformidade com os recursos disponíveis para a atribuição desse mesmo apoio.

Referindo-se à relação entre partidos e associações, refutou a ideia de que a substituição do sistema partidário por um sistema associativo seria, por si só, garantia de um sistema mais democrático e participado. Pelo contrário, considera que uma das melhorias a operar no sistema de democracia representativa, no sentido de o tornar mais eficaz e mais próximo dos cidadãos, passa por potencializar a multiplicidade de vias de participação já existentes, por parte de cidadãos, associações e outros agentes.

O facto de as associações não possuírem, actualmente, o papel de substituição do Estado no suprimento de necessidades básicas das populações, como ocorreu durante o Estado Novo, libertou-as para a sua intervenção em áreas como a cultura, a defesa do ambiente, entre muitas outras.

Reportando-se à questão da participação cívica e política, salientou a emergência de movimentos reivindicativos de novos direitos e de interesses concretos, que denotam a existência de movimentação social, contrária à marca do individualismo, geralmente associada à sociedade contemporânea.

Pedro Rodrigues mencionou ainda a sua experiência enquanto membro do Conselho da Cidade de Coimbra, iniciativa que nasceu como tentativa de congregar diferentes associações da cidade, para que, em conjunto, pudessem dar o seu contributo para as políticas públicas e a forma de governação da cidade.

Lamentou o facto de aquele órgão não ter atingido os objectivos a que se propusera, encontrando-se suspenso há vários meses, e considerou relevante reflectir-se sobre os motivos que conduziram ao fracasso daquilo que poderia ter sido um instrumento privilegiado para que as associações da cidade assumissem um papel activo e directo, na sua governação. Na sua perspectiva, o objectivo da constituição do referido fórum, era demasiado genérico e pouco mobilizador, tendo sido prejudicado pela própria diversidade das associações, pouco motivadas para debaterem temas que não estavam directamente relacionados com a sua própria realidade, o que criou dificuldades no diálogo entre as mesmas. Por outro lado, registou as tentativas de instrumentalização de que o Conselho da Cidade fora alvo, por parte da Câmara Municipal de Coimbra, nomeadamente quando esta solicitava a emissão de pareceres sobre diversos assuntos, assumindo o Conselho como um representante formal da sociedade civil e abdicando de ouvir as outras partes envolvidas. Essa atitude, por parte da Autarquia, foi acompanhada pelo desincentivo à participação dos cidadãos, classificando pejorativamente todas as iniciativas que escapavam ao seu controlo.

Daniel Francisco reiterou a ideia de que a diversidade do mundo associativo, implica que este não possa ser tratado como uma realidade homogénea, sublinhando também a instrumentalização de que muitas vezes as associações são alvo, por parte do poder político e do mundo empresarial. Considerou que as instituições públicas, quer ao nível central quer local, mantêm uma forte intervenção junto das associações, nomeadamente ao nível do controlo e formatação da vida associativa, não apenas pelo reconhecimento que o Estado faz, do seu contributo para o bem-estar colectivo e o aumento da coesão social, mas também por encararem o movimento associativo, como uma extensão do seu próprio poder.

Citando a obra do filósofo alemão, Jurgen Habermas, Crises de legitimação no capitalismo tardio, Daniel Francisco defendeu que as instituições públicas e o mundo empresarial encontram, ao investir no movimento associativo, uma forma de legitimação e de aproximação à comunidade. Na sua perspectiva, o investimento nas associações, por parte do Estado, não resolve problemas como o desinteresse dos cidadãos pelo mundo político, nem deve ser esse um veículo para a acreditação e legitimação de um qualquer poder. Neste sentido, mostrou-se favorável à possibilidade de os cidadãos poderem conceder uma parte dos seus impostos às associações que escolhessem apoiar, como forma de combater o crescente desinteresse dos cidadãos pela vida colectiva.

Por outro lado, Daniel Francisco explicitou um outro tipo de problema com que as sociedades pós-modernas se vêem hoje confrontadas e que se prende com a motivação colectiva; a este propósito, concluiu que os sentimentos e a vida individual dos cidadãos, reflectem, muitas vezes, o que se passa a nível colectivo. Na sua opinião, o mundo associativo pode desempenhar um papel importante na luta contra essas crises de motivação colectiva, pela dimensão que apresenta, na construção de sentidos para a vida das pessoas.

Retomando a ideia de que o poder político não pode dar tratamento igual a realidades distintas, Daniel Francisco salientou a ausência de critérios na escolha das associações que efectivamente contribuem para a construção de um sentido mais coeso e duradouro, na sociedade. A este respeito, referiu que, muitas vezes, o grau de institucionalização das associações, ao nível da sua relação com o Estado e da penetração social que apresentam, restringe-se à sua instrumentalização pelo poder político ou à vida de uma determinada liderança forte, da qual depende o peso da associação, na vida colectiva. Por outro lado, há associações que, em função do trabalho que desenvolvem, são adoptadas pela comunidade, como se respondessem a uma necessidade vital por parte desta, independentemente do seu sucesso de mercado, do seu líder ou do relacionamento que mantêm com os poderes político e empresarial. Pela capacidade de autonomia que possuem, são essas associações que demonstram a vitalidade de um determinado tecido associativo, gerando energia social, motivação e criando sentidos, narrativas locais, memórias colectivas, que as associam à sociedade onde actuam. Concluindo, Daniel Francisco defendeu serem estas últimas, as associações que deverão merecer mais atenção, por corresponderem a uma nova forma de gerir e de ver o Mundo, independentemente de poderem enquadrar-se em cidades que possuam uma vida política e empresarial forte, que ainda assim não as impede de criarem o seu próprio espaço.

Redacção: Alexandre Nunes

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